Tentar convencer alguém sobre a importância da
literatura nesta sociedade consumista e capitalista é difícil, principalmente
se levarmos em consideração as classificações apresentadas em obras sobre o
tema. Em uma falsa contraposição aos textos utilitários (não-literários), a literatura
é classificada como arte, mas também como não-utilitária. Texto sem utilidade,
então?
A palavra literatura vem do latim “litteris” e significa letras, por isso
se associa à gramática, à retórica e a texto. Porém, não se pode pensar ingenuamente que tudo é
literatura: nem todo texto e nem
todo livro publicados são de caráter literário. Definir literatura é
difícil porque se trata de um conceito histórico. Se antes a literatura era
feita de composições predominantemente orais e em versos, seguindo uma
estrutura formal de acordo com critérios estabelecidos desde a antiguidade, nos
últimos séculos sofreu uma evolução, aceitando novos gêneros e moldando-se à
criação de novos meios de veiculação, como a internet. Podemos resumir que
literatura é a arte da escrita em que o mais importante é o “como” se diz e não
“o que” se diz. Para muitos
escritores, a função da
literatura é a do deleite. É verdade! Quem não gosta de contemplar o belo? E
não significa que a literatura fale só do que é bonito, mas fala de maneira
bonita sobre coisas, fatos, pessoas,
inquietudes, alegrias e tristezas
humanas. A estética é importante. Mas
essa não é a única função.
A literatura também tem a função comunicativa: busca uma
interação entre interlocutores de épocas diferentes, e a função cognitiva, já que a literatura
sempre ensina algo mesmo quando isso não
é o compromisso (e não deve ser mesmo esse o objetivo), seja por retratar,
contrapor, romper os paradigmas ao que chamamos de realidade. Por exemplo, ao
lermos um livro do Machado de Assis, aprendemos sobre o gosto, os valores, os
costumes das pessoas daquela época. Uma fábula, narrativa com personagens
animais apresentando moralidades explícitas no texto, também nos permite várias
leituras. Quem não conhece uma versão da “Cigarra e a formiga”? Podemos lê-la
presos ao enredo, como uma estória de dois insetos, ou como metáforas de seres
humanos, ou como metáforas de uma
época, ou ainda como metáforas de nós mesmos, nos dois
papéis e conflitos: “quando ser formiga,
quando ser cigarra?” Por isso, esse e outros textos sobrevivem por séculos,
pois ainda falam à essência do ser humano.
Há ainda as funções político-social e humanizadora já que de uma forma
ou de outra desenvolve um projeto
transformador na sociedade. Citemos o livro “1984”, de George Orwel,
cujas vendas dispararam no mês passado. Isso ocorreu devido ao esquema de
monitoramento de dados realizado nos Estados Unidos. George Orwell foi um
visionário: na ficção escrita décadas antes, a sociedade era vigiada e controlada pelo personagem Big
Brother!
Existem sim várias formas de
conhecer a realidade, mas a literatura
pode nos oferecer elementos para entender esse mundo complexo,
envolvendo-nos ou distanciando-nos dele por meio de enredos mais realistas ou mais fantásticos. Em meio
às discussões sob a humanização de máquina, sob que paradigma você lê “Pinóquio”? Ou até mesmo “João e Maria”? “Cinderela”? Citamos essas obras consideradas pertencentes à
literatura infantil para ratificar: o próprio conceito de literatura muda com o
tempo, por isso uma obra lida por
diferentes leitores, ou em diferentes momentos, pode proporcionar diferentes
leituras.
Temos o privilégio de ter
escritores da região inscritos na história da literatura nacional: Paulo Eiró,
poeta do Romantismo, cuja biografia, sucinta nas poesias, parece uma ficção;
e José Paulo Paes, escritor da terceira
fase do Modernismo, que encantou adultos e crianças com seu poetar, e cita em
seu livro Quem eu? sua estada em Santo Amaro, lugar que adotou para morar. E
eles deixaram herdeiros...
Nós, moradores da Zona Sul de São
Paulo, temos a honra de ter um escritor em nossa região: Olívio Jekupê, que
revisita a estória do Saci, mostrando a versão (verdadeira) indígena. Ele foi
convidado pela FLIPinha a mostrar seu trabalho e a palestrar junto com Ricardo
Ramos, neto de Graciliano Ramos. E há outros escritores da aldeia Krukutu, em
Parelheiros, como Maria Kerexu, Luiz Carlos Karai, Jeguaka Mirin, Tupa Mirin,
Jera Gisela, todos autores guarani.
Temos, também em
Santo Amaro, os cordelistas Moreira de Acopiara, Varneci e
Pedro Monteiro, todos com livros publicados. Há as
escritoras Leda Kraml que escreveu sobre a Granja Julieta e Isaura
Camila Borges e Castro, uma lusitana santamarense. Sem deixar de citar os
contadores de história e escritores como a Andrea Sousa, Robson Sousa e João
Luiz do Couto e outros artistas da palavra que vamos descobrindo ou
redescobrindo nas casas de cultura, nos eventos, nas bibliotecas, nos sites...
Todos amantes e divulgadores da literatura. Para quê? Para alimentar a
imaginAÇÃO! (Daniella Barbosa e Ivete Irene dos Santos)
Edição 2724 - 13 a 19 de Julho 2013- LITERATURA PARAQUÊ?