Será impossível comentar os significados das
palavras e não comentar como professores foram importantes para despertar a
paixão por elas. Lembro-me, enquanto escrevo este texto, da professora Aureni,
professora de Língua Portuguesa da quinta série. Ela explicava a poesia contida
na palavra, e não só as palavras contidas na poesia. Já no Ensino Médio, tive outra professora
marcante: Marisa Neves, que me ajudou a decidir na escolha da faculdade: Letras, para continuar conversando
com as palavras. E assim eu relia e ressignificava textos já conhecidos.
A Bíblia, tomada como fonte religiosa ou
literária, explica: ao homem coube nomear as coisas. Embora o nome não tenha
que ter relação com a coisa nomeada,
passa a ter, pelo uso, pela história, pelo discurso, relação com a cultura. Por que maçã do rosto e
não laranja do rosto? Você já pensou que “enfezado” tem a mesma raiz da
palavra “fezes” ?
Os
termos “desorientado”, “desnorteado”, revelam o destino das navegações: era preciso saber para onde se ia, ou para
onde se tinha que voltar. A importância das
navegações também é sugerida no verbo “embarcar”. Durante séculos, “embarcação” era um
dos poucos meios de transportes existentes, hoje quem pode, embarca no avião, no
trem, no ônibus, no carro...
Referir-se a um pré-adolescente como “guri”,
“piá”, “moleque”, “garoto” acaba revelando a
origem do enunciador ou do ser descrito. “Idoso”, “na melhor idade”, “velho”, não são
sinônimos perfeitos, como não são equivalentes
“broto”, “mina”, “gata”,
“moçoila”, “senhorita”.
As referências aos relacionamentos também
sofrem transformações: “namorido”, “peguete”, “fiquete” são neologismos que compõe o vocabulário de
jovens.
Mas
a língua pode revelar outros aspectos: a
integração de culturas. Como apresentado em colunas anteriores, “capoeira”,
embora usado para designar uma luta da cultura africana, é um termo indígena.
Vários vocábulos revelam a nossa raiz indígena,
ainda que abafada ou despercebida, se o nome Brasil é devido à planta “pau Brasil”, para muitos
indígenas, este país era “Pindorama”, terra das palmeiras. Outros termos
indígenas integram nosso vocabulário: “Ibirapuera” significa "madeira
podre", “Pacaembu” é “arroio das pacas”; “Morumbi” é “morro ou colina muito alta” ou ainda “mosca
verde”, para outros etimologistas; “Jabaquara”
significa “rocha",
"buraco", "lugar
dos refugiados"; “Moema”,
personagem imortalizada por José de Alencar e nome de bairro, significa “mentira”, falsidade" .
A consulta a bons dicionários faz, se não a história, o
significado de alguns outros termos que nomeiam bairros: “Congonhas” é “planta da mesma família do mate”; “Grajáu”, é “cesto oblongo”. “Interlagos” significa “entre lagos” ( Embora se esteja entre represas, o nome é sonoramente mais
expressivo). O nome “Parelheiros” vem do costume germânico de fazer corridas
com um tipo de carroças puxadas por parelhas de cavalos.
Os imigrantes contribuíram com a cultura e,
consequentemente, com a inserção de termos que passaram a integrar a língua
portuguesa, inclusive com nomes próprios. Temos, por exemplo, simultaneamente John, João, Ivan, Hans, Jean e
Jonas.
E em se tratando de nomes até eles sofrem
influência da moda, tornando-se carregados de simbologia. O nome não é a própria
coisa, mas quem já não pensou que se tivesse outro nome seria outra pessoa?