sábado, 3 de agosto de 2013

Crônica AMIZADE ENTRE PESSOAS E LUGARES

Edição 2727 - 03 a 09 de agosto de 2013
 
Talvez imbuída pelo dia do amigo, comemorado no dia 20 de julho, a amizade  será o tema dessa crônica.  Não posso dizer que a Ivete Irene dos Santos, colunista neste espaço,  não estará presente  no texto, já que o tema é a amizade, e ela, companheira de discussões, estará presente em muitas das reflexões que farei aqui, até mesmo por que, nas semanas anteriores escrevemos sobre intertextualidade, interdiscursividade e originalidade, e comentamos como é impossível textos e discursos autênticos uma vez que recuperamos as produções já existentes. Como proposto no título, quero estender a amizade entre pessoas e lugares por que outras reflexões têm me permeado a cabeça nessas férias.
Tenho que contar um pouco da minha trajetória: não nasci em São Paulo, embora sempre me descreva como santamarense, e mais especificamente como moradora de Interlagos, minha relação com o lugar surgiu depois. Sou carioca e vim morar em São Paulo com três anos, na região do Campo Limpo. Conheci a Ivete em 2002, quando cursávamos o Mestrado e me lembro como foi nosso primeiro contato: mais extrovertida, na hora da apresentação informal, ela  perguntou “Alguém mora em Santo Amaro? Pois tenho a intuição que começarei uma longa amizade com uma moradora de lá e ela começará me dando uma carona”. De fato começava uma amizade, envolvida, inicialmente, pela paixão pelas Letras, já que fomos fazer Mestrado nessa área e depois por outras afinidades que surgiriam ou descobriríamos. A Ivete era apaixonada por Interlagos, nasceu aqui e achava que seu destino poético já tinha sido traçado antes mesmo de nascer: sua rua era Contos Amazônicos,  duplamente poético: explicitamente pelo nome e pela referência à obra do paraense Inglês de Sousa, e depois textualizado em poemas dela, expostos em mostras culturais, em eventos do CEUs, em blogs e em seu site. Um deles sintetiza seu destino, transcrevo um trecho do poema Infância em contos amazônicos: “Provavelmente, (para os outros),  o fato mais poético de minha vida \ Seja ter me criado na rua Contos Amazônicos \ Subúrbio, periferia de São Paulo. \ Mas não é assim que defino minha rua. \ Rua de fazer e viver poesias \ Rua de brincar de corda \ Emprestando minha mãe \ Que tinha o dom de transformar coisas em brinquedos...”.
Conheci a sua paixão pelo laguinho, pelos templos religiosos da região, pelas casas de cultura,  pelas histórias que me contava, pois ela trabalhou como professora nos bairros Colônia, Grajaú, Cocaia, conhecia as aldeias da região, participara  das festas de aniversário de Parelheiros, tinha os amigos que participavam das várias nações, etnias, culturas fundadoras e presentes na região.
Ela é filha de nordestinos que vieram “tentar a sorte” e, ao mesmo tempo, contribuíram com São Paulo, assim como eu sou filha de  mineiros que vieram fazer o destino em São Paulo. E se ela tinha parentes que passaram a morar perto de mim, na região de Campo Limpo, eu passava a frequentar mais Interlagos: começamos a trabalhar juntas em faculdades de ambas as regiões: “do lado de lá e do lado de cá da represa”, como costumávamos dizer, e textualizamos no poema Entrelagos.
Não sabia eu que,  depois,  também ganharia um endereço fixo em Interlagos. Há dez anos conheci quem viria a ser o meu marido,  alguém que representa bem a história da imigração: filho de alemães,  nasceu,  fixou-se , investiu como empresário  e  é apaixonado por Interlagos. Na minha vivência com ele aprendi  a enxergar a poeticidade desse lugar e a sentir saudades daqui, mesmo quando viajamos para lugares tão sonhados conhecer: ícones do Brasil e até mesmo ícones do mundo. Apaixonado por esportes náuticos, à frente do lago  Bodensee, na divisa entre Áustria, Alemanha e Suíça, ele disse algo que sintetiza Interlagos como sua pátria : “Prefiro minha represinha!”
Como em uma amizade verdadeira, vemos sim os defeitos de quem gostamos, o que não nos impedem de amar o lugar, pelo contrário, como educadora, cidadã, sou motivada não só a sonhar com uma região ainda melhor,  mas a agir , não necessariamente com grandes atos, mas com a crença  nas   pequenas semeaduras. E nisso incluem-se as palavras...
Daniella Barbosa Buttler

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