Edição 2727 - 03 a 09 de agosto de 2013
Talvez imbuída pelo dia do amigo, comemorado no dia 20 de
julho, a amizade será o tema dessa
crônica. Não posso dizer que a Ivete Irene dos Santos, colunista neste
espaço, não estará presente no texto, já que o tema é a amizade, e ela,
companheira de discussões, estará presente em muitas das reflexões que farei
aqui, até mesmo por que, nas semanas anteriores escrevemos sobre
intertextualidade, interdiscursividade e originalidade, e comentamos como é
impossível textos e discursos autênticos uma vez que recuperamos as produções já
existentes. Como proposto no título, quero estender a amizade entre pessoas e lugares
por que outras reflexões têm me permeado a cabeça nessas férias.
Tenho que contar um pouco da minha trajetória: não nasci
em São Paulo, embora sempre me descreva como santamarense, e mais
especificamente como moradora de Interlagos, minha relação com o lugar surgiu
depois. Sou carioca e vim morar em São Paulo com três anos, na região do Campo
Limpo. Conheci a Ivete em 2002, quando cursávamos o Mestrado e me lembro como
foi nosso primeiro contato: mais extrovertida, na hora da apresentação informal,
ela perguntou “Alguém mora em Santo Amaro? Pois tenho a intuição que começarei
uma longa amizade com uma moradora de lá e ela começará me dando uma carona”.
De fato começava uma amizade, envolvida, inicialmente, pela paixão pelas
Letras, já que fomos fazer Mestrado nessa área e depois por outras afinidades
que surgiriam ou descobriríamos. A Ivete era apaixonada por Interlagos, nasceu
aqui e achava que seu destino poético já tinha sido traçado antes mesmo de
nascer: sua rua era Contos Amazônicos,
duplamente poético: explicitamente pelo
nome e pela referência à obra do paraense Inglês de Sousa, e depois
textualizado em poemas dela, expostos em mostras culturais, em eventos do CEUs,
em blogs e em seu site. Um deles sintetiza seu destino, transcrevo um trecho do
poema Infância em contos amazônicos: “Provavelmente, (para os outros), o fato mais poético de minha vida \ Seja ter
me criado na rua Contos Amazônicos \ Subúrbio, periferia de São Paulo. \ Mas
não é assim que defino minha rua. \ Rua de fazer e viver poesias \ Rua de
brincar de corda \ Emprestando minha mãe \ Que tinha o dom de transformar
coisas em brinquedos...”.
Conheci a sua paixão pelo laguinho, pelos templos religiosos
da região, pelas casas de cultura, pelas
histórias que me contava, pois ela trabalhou como professora nos bairros
Colônia, Grajaú, Cocaia, conhecia as aldeias da região, participara das festas de aniversário de Parelheiros,
tinha os amigos que participavam das várias nações, etnias, culturas fundadoras
e presentes na região.
Ela é filha de nordestinos que vieram “tentar a sorte” e,
ao mesmo tempo, contribuíram com São Paulo, assim como eu sou filha de mineiros que vieram fazer o destino em São Paulo.
E se ela tinha parentes que passaram a morar perto de mim, na região de Campo
Limpo, eu passava a frequentar mais Interlagos: começamos a trabalhar juntas em
faculdades de ambas as regiões: “do lado de lá e do lado de cá da represa”,
como costumávamos dizer, e textualizamos no poema Entrelagos.
Não sabia eu que, depois, também ganharia um endereço fixo em Interlagos.
Há dez anos conheci quem viria a ser o meu marido, alguém que representa bem a história da imigração:
filho de alemães, nasceu, fixou-se , investiu como empresário e é
apaixonado por Interlagos. Na minha vivência com ele aprendi a enxergar a poeticidade desse lugar e a sentir
saudades daqui, mesmo quando viajamos para lugares tão sonhados conhecer:
ícones do Brasil e até mesmo ícones do mundo. Apaixonado por esportes náuticos,
à frente do lago Bodensee, na divisa entre Áustria, Alemanha e Suíça,
ele disse algo que sintetiza Interlagos como sua pátria : “Prefiro minha
represinha!”
Como em uma amizade verdadeira, vemos sim os defeitos de
quem gostamos, o que não nos impedem de amar o lugar, pelo contrário, como
educadora, cidadã, sou motivada não só a sonhar com uma região ainda melhor, mas a agir , não necessariamente com grandes
atos, mas com a crença nas pequenas semeaduras. E nisso incluem-se as
palavras...
Daniella Barbosa Buttler
http://www.gruposulnews.com.br/flip.php?id=114 (página 15)
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